sexta-feira, 28 de julho de 2017

Serra Da Bocaina - Primeira Parte

Uma formação montanhosa homógrafa a certa serra paulista e fluminense, distante 45km de Curitiba – mas quase totalmente desconhecida até então da maioria dos trilheiros do estado – constitui o ponto mais alto de toda a região fora da Serra Do Mar do Paraná. Seu pico maior, o Morro Da Bocaina, supera quaisquer altitudes do 2º e 3º planaltos, e para efeito de comparação, mesmo a Farinha Seca, Canavieiras e Baitaca, na Serra Do Mar, não igualam seus 1501,5m.


Uma mera observação ao subir as encostas do Capivari Mirim, em dia de forte calor, abriu nossos olhos para esse novo horizonte, de uma bela e acidentada silhueta que era alta demais para ser apenas simples colinas perdidas no relevo de Bocaiuva do Sul ou Tunas do Paraná. E embora já nos desviássemos do eixo habitual do montanhismo, a Bocaina foi motivadora das muitas trilhas (ao norte da capital), que divulgamos neste blog; sendo este talvez o artigo mais importante de todos até aqui.


É composta por 5 morros principais, sendo que apenas o maior deles tem nome conhecido pelos moradores do entorno, ou inscrito em mapa; razão pela qual os referimos de ora em diante como números em ordem decrescente de altitude, para fins de descrição, tal como exposto na imagem a seguir. Por vezes o próprio Morro da Bocaina também será mencionado como “1”, comparativamente. Além deles, existem duas elevações menores – leste e sudoeste – as quais tratamos por “colinas”.

Característica comum a outras serras desta região, sua base noroeste é mais alta e relvada, com maior presença humana, enquanto a vertente sudeste é coberta por floresta; com inclinações que em alguns pontos chegam a ser penhascos.

Antes da finalidade de descrever suas trilhas conforme as conhecemos, cabe mostrar uma foto rara – acompanhada pelo relato – do reconhecimento feito na Bocaina em idos anos 50 durante a "1ª Expedição Científica À Serra De Paranapiacaba E Ao Alto Ribeira" pelo grupo do Coronel João De Mello Moraes e Major Sinval Pinheiro, ambos do Serviço Geográfico do Exército.

Empreenderam esta viagem entre janeiro e abril de 56, tendo seu trabalho republicado pela Revista Brasileira de Geografia, edição abril - junho de 57. Naqueles tempos pioneiros, a região também foi sondada pelo historiador Ermelino De Leão e provavelmente pelo geólogo Reinhard Maack. [Cortesia da biblioteca do IBGE em Curitiba.]

No dia 13 de maio desse ano (2017), depois de muito planejar, iniciamos o intento de conhecer os 3 principais morros deste conjunto, e a partir aqui retratamos como foram as investidas.

Morro 3 – Reconhecimentos E Primeiras Impressões

Entrada
Com altitude semelhante ao Tapapuí, o Morro 3 é a porta de entrada da Bocaina, não somente por ser o 1º visto da estrada, mas por ser o único inteiramente acessível de carro (4 x 4) e estar dentro de uma propriedade bastante hospitaleira. Vindo de Curitiba pela BR-476, passados 1,6 km da pousada Valle do Ribeira (Ribeirão Das Pedras), entra-se à direita na estrada Eulisses Milani, (com trajeto em boas condições), e segue-se por aprox. 7,4 Km até a Fazenda Serra Da Bocaina, constante em carta topográfica. Pouco antes da porteira principal no lado oposto da rua, vive o irmão do caseiro, ante cuja casa nos foi permitido deixar o carro durante nossas 4 idas.

Passagem do 3 para o 2

O que então se vê é um morro comprido, cujo cume está um pouco para trás, e de início aparenta ser mais baixo do que é. Para chegar ao caseiro, entra-se por uma porteirinha a 70m da principal, e passa-se junto aos animais, que são mansos (inclusive os bovinos). O local pertence a um empresário do ramo de transportes, e parece ter uma produção relativamente pequena, em face de sua extensão. Ser o caminho por uma estrada pode dar a impressão de que a serra toda é um lugar fácil e confortável, mas não demoraríamos para conhecê-la de verdade. Por coincidência, quando lá chegamos, o caseiro e sua esposa também iam para o cume, e nos deram carona na caçamba de uma Toyota, resultando numa experiência ruim para alguém do nosso grupo, embora aos demais fosse bem divertido.


A paisagem ao redor começa a causar admiração; encontra-se desde o entorno da Estrada da Ribeira, a Serra De Santana, e os morros perto de Tunas. Para o norte e nordeste estava a nossa grande curiosidade de como seriam os morros 2 e 1, (deste só avistamos a silhueta). O 2 é o que se vê mais bonito dali, com aquele aspecto de "gominhos" por entre os recortes nos pequenos vales onde flui a água das chuvas. Dentre os morros "conhecidos", o menos distante dali é o Capivari Mirim, e assim mesmo são mais de 20km em linha reta. Isso não impede de se ter um panorama privilegiado de toda a Serra do Mar, como se desde a 1ª fila de uma plateia observássemos um palco.

Guaricana

A altitude mostrada no GPS supera um pouco os 1430m. Há um muro baixo que circunda alguns metros do cume, e nele uma cruz, sendo que adiante encontra-se trilhas entre os arbustos. Ao final deles, numa relva baixa é possível avistar detalhes de uma crista do Morro 1; e só então foi que começamos a notar como ele é impressionante. O que do Google Earth se afigura como uma sucessão de relevos não tão recortados é na verdade uma sequência de topinhos íngremes com feições bem mais "hostis" do que imaginamos. Contou-nos depois o irmão do caseiro algo que já era de se supor, a existência de uma trilha entre os cumes do 3 e do 2.


Muito bom visual também se tem num topinho, à direita de quem está retornando do cume. Já à esquerda percebe-se a crista longa e relvada que termina no vale ao início da Colina Sudoeste, quase "pedindo" para também ser percorrida. Existe outra estrada, um pouco paralela à principal, que também desce à fazenda, mas voltamos pela que já conhecíamos. Neste dia ainda nos faltava por visitar uma queda d'água 'deliciosa' que observamos na imagem de satélite, e que veio a ser parte importante desse passeio.



Cachoeira Do Rio Bocaina

Descrito em algumas referências como Arroio Águas Amarelas (tal característica não notamos muito), o Rio Bocaina é afluente do Passa Vinte, e tem nascentes tanto nos morros 2, 3 e 4, quanto nas colinas do outro lado da Eulisses Milani. Vem a completar o laurel daquela fazenda com uma das mais bonitas cachoeiras existentes nos entornos da capital. Ao fim da descida, entramos à esquerda numa estrada interna que logo se aproxima do rio, estando quase paralela. Este corre para o sul, e a 1ª das suas quedas encontra-se a 1km de distância da casa do caseiro, enquanto a 2ª está a aprox. 2km.

Queda maior

Há no caminho uma porteira sem cadeado, e a queda menor fica pouco adiante dela, à direita; desde onde se desce por degraus de pedra. Se a intenção for só o banho, ali já será satisfeita. Mais perto da cachoeira principal, o vale onde o rio passa começa a parecer cada vez mais profundo. A estrada termina numa clareira, e bem na sua borda inicia outra escadaria, que é bem mais longa que a anterior. Ouve-se bem o rumor da água desde o 1º degrau; e ela começa a ser visível na metade da descida. Tem uma boa altura; seu poço não é fundo, e seria impossível não entrarmos nela, caso aquele não fosse um dia frio.


 Tínhamos dado o 1º passo na descoberta da Bocaina, e depois desta vez, alternamos as investidas com outros morros descritos no blog, como foram o Lorena, Betara e Baleia. As idas seguintes e seus resultados são descritos na 2ª parte deste artigo.

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Cachoeiras Do Rio Itararé

Procurando resolver certa dúvida com a carta topográfica “Pedra Branca Do Araraquara”, tempos atrás me surpreendeu a informação “de mão beijada” sobre a existência de uma cachoeira no Rio Itararé (divisor entre Tijucas Do Sul e Guaratuba), num ponto ao norte da BR-376, cuja margem oposta dá acesso ao Morro dos Perdidos. Não a famosa (ou melhor, as famosas) que ficam dentro da propriedade, e que são o complemento ideal para o passeio no cume, mas outra, nominada “Cachoeira Dos Jesuítas”. Fato raro, pois quando muito encontra-se nesses mapas apenas um tracinho situando a queda, ou às vezes uma desinteressada abreviação “Cach”, como foi o caso da Colle, em Quatro Barras.


Antes de formar a atraente visão que se tem até mesmo da estrada, o rio Itararé desce a floresta da encosta leste do Morro Araçatuba, e passa (provavelmente) por cascatas menores, até atingir as grandes quedas que estão a 'módicos' dez reais de distância do visitante. Menos gente sabe que a beleza não termina ali, e que para baixo da ponte há outra cachoeira, com características distintas, cuja trilha inicia à esquerda da rodovia, a 310m da P.R.F.


O percurso começa atravessando um filete d'água que corre paralelamente à pista, onde a descida é suave, mas o barranquinho oposto é bem íngreme; sendo este o único ponto ruim do primeiro trecho. Pouco antes da chegada, vê-se um outro caminho, para a direita, que leva ao topo da cachoeira; e quem optar por conhecê-lo deve cuidar bastante com o declive. É uma larga queda d'água, que não lembra as da Serra do Mar e litoral, e sim as da região central do estado. O poço é amplo, e de frente para ele as rochas são fendidas de modo que parece proposital, como para o visitante se sentar diante dela com certo conforto.

Viria a saber que mais tarde a Cachoeira 1 foi marcada por alguém no Google como "Cachoeira Alemão-Cwb", e que infelizmente esse nome foi acreditado por muita gente. Provavelmente trata-se de algum usuário que, em vez de se informar com moradores, ou em último caso batizar o lugar com um nome neutro, resolveu dar seu próprio apelido ou nome de usuário dentro do Google; atitude essa que nos parece simplesmente asquerosa.




Abaixo do poço, a água corre por mais uma parte espraiada, aonde se chega pela esquerda, por uma pedra bem no canto, evitando com isso passar entre as do meio. Ao cruzar esse ponto, com maior distância da cachoeira, pode-se tirar ótimas fotos. Também se nota que à jusante, o desnível do rio continua, e muito. Forma-se uma longa cascata, bem aberta, não muito íngreme, mas também bonita. Na margem direita é fácil perceber uma trilha que acompanha o rio e segue paralela a ela, entre um pouco de mata, mas com boa vista desde alguns pontos. A trilha alcança uma parte do rio onde a água perde velocidade; até ali ainda se vê indícios de presença humana. 


Depois já não é inequívoca, e exige em alguns pontos que se ande pelo rio, mas em parte rasa. A recompensa, mais adiante, é um local aberto onde a água se divide e forma cascatas menores, uma das quais mais vertical, ponto esse bem menos frequentado. Chega a ser um local mais agradável que o poço maior. Do barranco direito vem uma certa trilha, que inicia na chácara vizinha, cujo dono foi quem me indicou essas cascatas, às quais eu já pretendia ir porque suspeitava da existência. Desde a BR são aproximadamente 600m de caminhada até elas. Mas qual exatamente é a Cachoeira dos Jesuítas, mostrada no mapa? Só viria a descobrir isso 2 anos depois.



Dentre os muitos ônibus que passam pela localidade, só duas empresas a atendem; uma é a Catarinense, que só serve na ida, porque na volta não para na estrada. Paga-se a passagem inteira até Garuva. A empresa que serve na ida e na volta é a Expresso Maringá, com os ônibus que vão para Guaratuba. Recomenda-se embarcar não na rodoviária de Curitiba, encarecida pela taxa de embarque, e sim na Agência Pinheirão de são José dos Pinhais, onde os primeiros horários de ida são 07:20 e 11:20; e os últimos de volta são 12:15. 14:45, 16:20, 18:45 e 20:15. R$17,80. Há o risco de o ônibus vir lotado e não parar na estrada. Mais que em outros lugares, sem entrar em detalhes, desaconselha-se pegar carona ali. Horários consultados em 06/2017. O telefone da agência é 3384-2647; mas quase nunca atendem.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Guia Eco Verão


Não é de hoje que o litoral paranaense, por ter a sua população multiplicada durante cada veraneio, recebe do governo os recursos e as atenções correspondentes, na forma de operações sazonais voltadas ao turismo, do qual toda a sua economia depende. Num recente passado, em tempos de orelhões cor de laranja e dólar a R$1,16; a então operação Eco Verão (que atualmente perdeu o "Eco") trazia consigo além de policiais e bombeiros, um guia informativo gratuito mais completo e de mais alta qualidade gráfica que os distribuídos nas últimas temporadas. Um compêndio descritivo de várias atrações dos 7 municípios denotava os melhores esforços de quem o elaborara, a fim de que o veranista dispusesse de todos os conhecimentos para desfrutar e gastar nas nossas praias.

Outrora facilmente acessível, a edição de 1998 hoje é quase rara, encontrada somente em alguns sebos - de um dos quais agora trago em duas formas.

Baixar pelo link:

Visualizar no navegador, com qualidade um pouco menor em:
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A qualidade das imagens não é 100%, mas todo o conteúdo está presente. Nessas 117 páginas, uma versão bem ampliada da de 1997, há algo de muito nostálgico especialmente para quem conheceu e curtiu o litoral do Paraná àquela época.


As imagens que o ilustraram foram desenhadas por um artista de talento, que juntava as representações dos locais numa maneira bem parecida com a que faz nossa imaginação ou memória afetiva sobre determinada região; e todos os seus elementos, desde os ícones, pareciam estrategicamente criados para instigar nossa vontade de aproveitar cada ponto turístico.


Uma enormidade de atrativos do litoral, talvez por desconhecimento, estavam ausentes; e algumas descrições continham informações imprecisas; mas por outro lado constavam alguns que, de tão "longínquos", são ainda hoje pouco conhecidos da maioria dos turistas, como o Rio Pasmado e a Serra Gigante. As histórias dos caminhos coloniais, por exemplo, que foram tema inicial desse blog, traziam uma linguagem vagamente semelhante à do livro de Júlio Estrela Moreira, quem por sua vez tivera como fonte maior as "Memórias Cronológicas" do historiador Vieira Dos Santos, (Séc. XIX).


É perceptível que nos guias dos anos seguintes, geralmente mais simples e sucintos, o padrão dos textos é basicamente o mesmo, inclusive nas imprecisões. E talvez ainda hoje muitos litorâneos não lhe façam caso, descartando-o às vezes como folheto de propaganda. Mas quem ainda tiver outros materiais turísticos do litoral, anteriores ao ano 2000, e deseje compartilha-los, é favor entrar em contato com o e-mail gomes681@gmail.com

Passado algum tempo, também tive acesso à versão de 1997; e aqui está para download (.rar):


Não sendo muitas páginas, o arquivo tem pouco menos de 5Mb. E este é o link para leitura online (menor qualidade):


Em 1997, para um olhar curioso, um "mundo" cabia nessa imagem...


quinta-feira, 15 de maio de 2014

Caminho Do Arraial


Um dos principais caminhos coloniais que faziam a ligação entre o litoral do Paraná e o altiplano onde Curitiba se situa, o Arraial foi via importante por onde passou a história do estado, sendo partícipe na sua formação e na sua identidade. Anteriormente com 10,75 léguas, ou 53,7 km, seu calçamento de pedras enveredava a Mata Atlântica no enorme desnível da Serra do Mar, unindo o atual município de São José Dos Pinhais com o Porto Fluvial Do Padre Veiga, em Morretes, por onde circulavam as mercadorias vindas ou destinadas ao trânsito marítimo. Palco por três séculos e meio de aventuras, dores e fortunas, fora em tempos pré-cabralinos possivelmente uma picada por onde a nação indígena Carijó se deslocava, ora à baixada na época de mariscos, ora de volta ao planalto na época do pinhão.


A despeito de tal origem, nunca constituiu um “ramal” do Caminho do Peabiru, como levianamente se divulga; tampouco uma simples “estrada dos Jesuítas”. Degradado hoje por obras estruturais e pelo imerecido esquecimento, representa um valioso patrimônio paranaense relegado ao longo de alguns quilômetros de floresta. Deu também origem a este blog, cuja intenção antes dos relatos de trilha seria tratar sobre história. Depois da tentativa frustrada, em 2013, de encontrar seus trechos preservados (como citado noutro artigo), fizemos novas visitas aos seus arredores, durante as descobertas das cachoeiras 1 e 2 da parte alta do Rio Fortuna; e também as do Rio Da Serra. As mesmas pessoas que nos orientaram sobre esses rios acabaram esclarecendo detalhes do Caminho Do Arraial. Passados alguns anos, este artigo deixa de ser um resumo histórico com um parêntese sobre a descrição atual, e passa a ser um relato da trilha atual, com um longo parêntese sobre sua história.




De tudo o que restou, o Arraial ao sul da BR-277 e o Arraial ao norte dela são dois mundos diferentes. Menções aos possíveis trechos calçados incluem descobertas feitas no tempo dos estudos para criação do Parque Guaricana. Nunca pisamos no lado sul; esperamos fazê-lo um dia, e imaginamos que seja uma paisagem de planalto rural, bucólica e tranquila como os demais interiores de São José Dos Pinhais. Já o lado norte, a descida da serra, é o contrário; um florestão perpetuamente disposto a fazer sumir o calçamento existente. Tendo o oleoduto OLAPA como o "eixo" do passeio, percorremos 2 dos seus prováveis 5 trechos, totalizando 1,79Km que são a parte em que se pode andar sem grande dificuldade.

Acesso

Começo da descida
Iniciamos na 1ª estrada de servidão da Petrobras, pois nossa intenção era andar noutra parte do calçamento desde cima, o que não foi possível por estar a mata muito fechada, e dessa forma acabaríamos gastando todo o tempo disponível numa só parte do trajeto. Descemos pela faixa de servidão até o Rio Da Serra, onde mostrei à minha amiga a cascata mais próxima, e logo seguimos para a entrada do trecho maior do Arraial, único que conhecia desde pouco tempo. A localização de cada coisa, assim como as distâncias e aquilo que presumimos ficarão bem claros no mapa seguinte. Estava bem mais limpo que na vez anterior, mas foi só nos 320 primeiros metros até a torre da linha de transmissão, creio eu, para uso dos funcionários da Copel. É interessante pensar que os séculos passaram, e o caminho continua sendo útil para alguém.


E tão roçado estava, que foi possível ver e ouvir ao longe o Salto Da Fortuna e as outras duas cachoeiras acima dele. Em seguida cruzamos um breve pedaço de floresta que separa ambas linhas de transmissão; e sob a segunda delas encontramos o bananal onde a trilha se torna bastante intrincada, antes de retomar a descida. Esta é a única parte que pode confundir um pouco. Entre a reentrada na floresta e a chegada na trilha do Fortuna, pode-se dizer que é o centro do passeio. Em trilhas antigas percorridas por mulas, mesmo as que não chegaram a ser calçadas, observa-se frequentemente que ao menos uma das laterais é mais alta, como se o caminho tivesse sido abaixado e aplainado. E de quando em quando, passa-se por vestígio de escoamento de água, na lateral oposta. Cuidar tal detalhe é garantia de não sair da rota certa, mesmo havendo várias curvas e trechos onde a folhagem cresceu.



Antigo engenho de mate
O mesmo Rio Da Serra por onde passamos antes curva-se para encontrar o Fortuna, e no final da descida é o seu ruído que predomina, quase abafando o de um filete d'água que existe à direita da trilha. A 75m de distância dela, no lado esquerdo, há uma vala murada que é o que restou de um dos beneficiamentos de erva mate da região. Mal aparece o vestígio até ele; a mata já quase o engoliu. Quando inteiro, o Arraial virava um pouco à direita e seguia até o segmento conservado que hoje se conhece. Mas infelizmente houve um desmoronamento, sabe-se lá em que época, obrigando os passantes a usarem um curto desvio um pouco duvidoso até alcançar a trilha do Fortuna. Nela fomos até o 1º cruzamento de rio, mas só para descansar um pouco pois naquele dia tínhamos receio de cabeça d'água; e até já estava garoando um pouco.


Já na parte preservada, lembro o que senti quando anos atrás pisei aquelas pedras pela 1ª vez; toda a curiosidade e desconfiança de que talvez nunca chegasse a conhecer sua continuação, tanto para cima, quanto para baixo. Esta era a parte que então faltava, e sem saber em que condições a encontraríamos, tínhamos o desafio de percorrê-la inteira, até a saída de volta no oleoduto. Facão ali é cômodo, mas nem de longe é necessário; há bastante espaço para andar, e até mais da metade da distância, a lateral alta na direita é bem reconhecível. Até que aparecem vestígios para a esquerda, em terreno mais lamacento e sem pedras, resultando numa trilha estreita cujo sentido era o que queríamos, de modo que saímos na faixa de servidão.

Parte preservada que coincide com a trilha do Salto Fortuna. Na 4ª imagem, a entrada da continuação, rumo ao oleoduto.

Foi-nos dito que do outro lado dela há um último trecho em pior estado, que seria necessário investigar de baixo para cima, por assim ser menos complicado. Não estava roçado o mato, no que nos restava para andar no oleoduto, mas havia uma picada nele; e em pouco tempo cruzamos o início da trilha normal do Fortuna, para em seguida chegar ao Sítio Vanessa. Lá viríamos a conseguir uma carona. A caminho do centro de Morretes, sabemos da existência de pelo menos uma casa em cujo terreno ainda existem pedras do Arraial. Parece até algo recente, uma calçada comum. Dos remanescentes deste caminho que fez parte da história de tantos homens e mulheres do nosso estado, é justo ali onde corre o menor risco de ser destruído.